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Em coletânea, caricaturista Cássio Loredano expressa sua paixão literária

Com lançamento neste domingo, ‘Gente de letras’ reúne 200 desenhos de escritores
Caricatura de Clarice Lispector, uma das escritoras prediletas de Cássio Loredano Foto: Cássio Loredano / Reprodução
Caricatura de Clarice Lispector, uma das escritoras prediletas de Cássio Loredano Foto: Cássio Loredano / Reprodução

RIO — Caricaturista especializado em “animais literários”, como chama os escritores e intelectuais a quem destina seus traços, Cássio Loredano já perdeu as contas de quantas vezes leu “Dom Casmurro”, de Machado de Assis, assim como já não sabe por quanto tempo tentou esculpir uma caricatura à altura do bruxo do Cosme Velho, seu escritor predileto.

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Para ele, quanto mais intimidade e devoção a um autor mais árdua é a tarefa de recriar a sua fisionomia. Foi assim com Machado (que, por fim, acabou estampando a capa do livro), Clarice Lispector e Max Frisch — alguns de seus preferidos —, mas chega uma hora que a sorte “aparece para quem está instrumentado e preparado”, diz.

É o resultado desses momentos de “sorte” que ele apresenta no livro “Gente de Letras” (Editora Sapoti), que será lançado neste domingo (30), na Livraria Folha Seca, às 15h. A obra reúne 200 retratos feitos para os mais diferentes veículos de mídia impressa do Brasil e do mundo, entre os quais O GLOBO, que publicou dezenas de seus desenhos. Para Loredano, o livro é um balanço de seus 46 anos de carreira e de seus 70 anos de vida.

— É um livro dedicado ao meu pai e às minhas filhas. Fiz 70 anos, e o livro é meio como quem diz: “O que esse malandro fez a vida toda? Só tomou cerveja?” Não. O livro é isso.

“Sempre tive predileção absoluta por desenhar escritores. Primeiro, porque foram os caras que deram as maiores alegrias da minha vida. Segundo, porque os escritores sempre têm as fisionomias mais interessantes e intensas.”

Cássio Loredano
Caricaturista

A obra é, portanto, uma revisão de trajetória e, ao mesmo tempo, uma exaltação de suas preferências:

— Reuni meus melhores desenhos, e sempre tive predileção absoluta por desenhar escritores — diz. — Primeiro, porque foram os caras que deram as maiores alegrias da minha vida. Segundo, porque os escritores sempre têm as fisionomias mais interessantes e intensas. Diferentemente dos políticos, que é uma raça que terrível. Quando tenho que desenhar um político já vou predisposto a não gostar, já com o escritor é o contrário.

ESCRITORES x POLÍTICOS

Para ele, a diferença entre escritores e políticos — a honestidade e o cinismo diante da condição humana — se revela na fisionomia.

— A fisionomia pouco mente. Então quando são escritores muito honestos, como Machado, você vê na fisionomia a intensidade, que deriva de um sofrimento, de um mergulho na alma humana, de um escritor que escreve a partir de um autoexame, que sabe que aquele que exterminou pessoas na Alemanha era uma ser humano. Então tudo isso implica um certo sofrimento que torna o rosto interessante. O contrário disso é o cinismo de um Maluf, alguém que você dá um soco na cara e ele não sente, porque tem aquele rosto de borracha. O escritor é o contrário. Ele sente. Você olha pra Clarice (Lispector) e sabe que as coisas não são simples.

Capa do livro 'Gente de Letras', de Cássio Loredano, com Machado de Assis na capa Foto: Divulgação
Capa do livro 'Gente de Letras', de Cássio Loredano, com Machado de Assis na capa Foto: Divulgação

Ao lado de Machado, Clarice também deu trabalho a Loredano, assim com Drummon e outros tantos que ele admira e que, “depois de muita borracha”, o desenhou saiu e agora se eterniza no livro.

— A Clarice me deu surras homéricas, assim como apanhei anos para conseguir desenhar o Machado. Quando conheço menos o autor é mais fácil, porque você parte direto para a fisionomia — diz. — Mas o segredo pro desenho, ou pelo menos o que tento fazer, é ser o menos Loredano possível. Quanto mais despido eu tiver de mim mesmo é aí que eu começo a ter chance de fazer algo razoável. É tipo cavalo de santo. Você sai de si e algo incorpora. Mas tem que estar treinado pra hora que o santo aparece. Aí a felicidade vem e você agarra.

Serviço — “Gente de letras”

Autor : Cássio Loredano. Editora : Sapoti. Páginas : 200. Preço : R$ 50. Lançamento : Livraria Folha Seca — Rua do Ouvidor, 37. Quando : Domingo (30/9), às 15h.